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Artigo de Carlos Alberto Di Franco - Os dois Brasis - Estadão, 13/05/2024

  Os dois Brasis e a verdade O descaso com a transparência está relacionado com a percepção de certas autoridades: não se enxergam como servidores, mas como donos do poder Existem dois Brasis. A dicotomia é cada vez mais evidente e está gritando na força irreprimível da verdade dos fatos e das fotos. Existe um Brasil dominado por uma casta que vive do poder, do dinheiro, da vaidade e da ideologia manipuladora. E existe um Brasil constituído por um povo trabalhador, amável, tolerante, carregado de valores e que, finalmente, despertou para o exercício da própria liberdade. O Brasil daqueles que vivem do poder foi flagrado em dois episódios recentes aqui reproduzidos. A BAT Brasil, anteriormente conhecida como Souza Cruz, patrocinou o “1.º Fórum Jurídico: Brasil de Ideias” em Londres, que contou com a presença de ministros do Supremo Tribunal Federal (STF), autoridades do governo Lula da Silva, juízes de Cortes Superiores e representantes de empresas privadas no hotel de luxo The Peninsul

Artigo de Sergio Fausto - Estadão, 12/05/2024 - Lições do Plano Real

  Lições do Plano Real A principal delas é que só a política é capaz de levar o País a superar seus impasses e bloqueios O aniversário de 30 anos do Plano Real convida a refletir sobre os fatores que o levaram a ter êxito. Que lições continuam válidas até hoje? A primeira delas é que não se pode fazer nada de bom e duradouro em matéria de políticas públicas sem conhecimento especializado. A vontade não substitui o conceito. O Plano Real se beneficiou de um longo amadurecimento da reflexão acadêmica sobre as características próprias do processo inflacionário no Brasil. O departamento de Economia da PUC-Rio foi o principal centro dessa reflexão. Ali nasceu a ideia de levar à indexação ao extremo para debelar a inflação. Passaram-se mais de 15 anos entre o primeiro lampejo – apresentado em um texto para discussão por André Lara Resende – e a concretização da ideia sob a forma engenhosa da URV. A segunda lição diz respeito à importância de expressar ideias gerais abstratas na linguagem con

Editorial do Estadão, 12/05/2024 - A lógica da indecência

  A lógica da indecência Magistrados nos altos escalões do Judiciário defendem o quinquênio como forma de impedir ‘abusos’, de premiar a ‘qualificação’ e, pasme o leitor, de impedir a corrupção de juízes O presidente do Supremo Tribunal Federal, Luís Roberto Barroso, admitiu a magistrados que manobra pela aprovação da Proposta de Emenda Constitucional (PEC) – aprovada pelo Senado e em trâmite na Câmara – que concede a juízes, promotores e ministros dos tribunais de contas um adicional de 5% no salário a cada cinco anos. Segundo ele, esse quinquênio valorizará a parte intermediária da magistratura, mas “sem os abusos” do topo de carreira. Isso porque a PEC prevê que o bônus será limitado a 35% do teto constitucional. De fato, os juízes no topo já não receberão aumentos, mas nem precisam, porque, na prática, o teto salarial terá sido abolido. A ideia de que o quinquênio valorizará juízes, “mas sem abusos”, é uma impossibilidade lógica. O quinquênio é, em essência, abusivo, em múltiplos a

Editorial da Folha de São Paulo, 11/05/2024

STF perde credibilidade ao decidir sobre estatais Corte demora para atestar óbvia constitucionalidade de restrições a indicações políticas, mas mantém as feitas por Lula O Supremo Tribunal Federal demorou pouco mais de um ano para enxergar o proverbial óbvio diante do nariz: que a Lei das Estatais não viola a Constituição. Aprovada pelo Congresso em 2016, a norma surgiu como resposta aos prejuízos bilionários e escândalos de corrupção investigados durante anos pela Operação Lava Jato. Seu propósito foi o de erigir balizas moralizadoras dentro das empresas estatais, cujos cofres sempre despertaram a cobiça dos mais variados partidos. Algumas das soluções apresentadas na lei são de tal simplicidade, e representam um avanço institucional tão evidente, que chega a ser difícil fugir à questão: por que essas exigências não existiam antes? Tome-se o caso das nomeações políticas para a direção das estatais. Consta do diploma de 2016 que não podem ser nomeadas para o comando dessas companhias p

Primeiro Editorial do Estadão, 11/05/2024

  A Constituição que vale e não vale ao mesmo tempo STF não se constrange em conceber uma esdrúxula tese de ‘inconstitucionalidade temporária’ de um artigo da Lei das Estatais apenas para acomodar o interesse político de Lula A fim de fazer política bem ao agrado do presidente Lula da Silva, o Supremo Tribunal Federal (STF) mostra-se disposto a cometer uma atrocidade jurídica sem precedentes na já trepidante história recente do Poder Judiciário. Por 8 votos a 3, a Corte julgou que são constitucionais os dispositivos da Lei 13.303/2016, a chamada Lei das Estatais, que blindam a administração dessas empresas de qualquer ingerência indevida por meio da nomeação de políticos para cargos de direção. Contudo, a maioria dos ministros sinalizou que não há razão para o Palácio do Planalto se preocupar. Malgrado o resultado do julgamento da Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) interposta pelo PCdoB, todas as nomeações feitas por Lula fora da lei – tal como o texto fora aprovado pelo Congre

Carlos Andreazza - Um bom artigo de estreia no Estadão - 10/05/2024

O bravo Dias Toffoli não quer que suas palestras em eventos privados sejam questionadas Ministro podia ser transparente, mas preferiu reagir à fiscalização sobre sua atividade pública citando números de atuação da Corte Por Carlos Andreazza 10/05/2024 | 18h00 Dias Toffoli não gosta de jornalismo e está bravo com a imprensa. Não quer que suas viagens para palestrar em eventos privados sejam questionadas. As reportagens a respeito seriam “absolutamente inadequadas, incorretas e injustas”. Adequadamente, expressou seu repúdio à atividade jornalística antes de palestra em evento privado. É um perigo quando nosso editor supremo – “enquanto Suprema corte, nós somos editores de um país inteiro” – fica bravo com a imprensa. O monocrata, que compreende o tribunal como poder moderador, pode exercer seu autoritarismo – não deixa de ser forma de edição – ordenando censura. Dias Toffoli, ministro do STF Foto: Rosinei Coutinho/SCO/STF Não é preconceito. O “amigo do amigo do meu pai” não apreciou

Artigo de Conrado Hubner Mendes, FSP, 08/05/2024

Contra servidores públicos Quinquênio mostra como o custo magistocracia turbina o custo Brasil Bom magistocrata opera em silêncio. Atua na política juris-clientelista à maneira do centrão. Barganha a portas fechadas. Evita a armadilha de argumentar em público na defesa de privilégios. Argumentos, afinal, supõem referência plausível ao bem comum, alguma aparência republicana. Precisa ser crível à inteligência média. Desmandos não costumam passar no teste, mesmo que se imponham pela força. O manifesto da dignidade magistocrática, divulgado semana passada, foi desabafo do bom magistocrata. Deixou escapar revelação de profunda sinceridade: "não somos servidores públicos". Para quem não entendeu a síntese do ethos magistocrático, três juízes deram exemplos nos últimos dias. Quando juiz desobedece a cartilha do silêncio e tenta argumentar, um grande evento pedagógico acontece. E nos ilumina. Torres Garcia, presidente do Tribunal de Justiça de São Paulo, vê a perspectiva de ressusci

Artigo de Conrado Hubner Mendes, FSP, 01/05/2024

Manifesto da dignidade magistocrática A eurotrip de juízes e advogados viola a lei, mas quer civilizar o país Depois de tudo que fizemos pela democracia e pelo combate à bestialidade autoritária, estamos cansados. Cansados com a falta de gratidão e com o excesso de vigilância sobre nossos hábitos anti-institucionais. Cansados com o sarcasmo. Estamos irritados com o excesso de perguntas e de voyeurismo. Irritados com o assédio à nossa vida privada. Não somos servidores públicos. Por isso, vimos nos manifestar. Não ofendam nossa honorabilidade. Nossa juspornografia é limpa e asseada. O Febejapá (Festival de Barbaridades Judiciais que Assolam o País), carinhosa homenagem a Stanislaw Ponte Preta, é de nossas tradições mais distintas. O pornográfico está nos olhos de quem vê, o bárbaro na pele de quem sente. Perdoem a nossa nudez, mas nossa dignidade está acima do seu moralismo. Respeitem nossas fugas da lei e do país. Respeitem nossos quinquênios e remunerações ilegais. Aprendemos a chamar

Editorial do Estadão, 01/05/2024

  O agro não precisa de Bolsonaro A atuação política do setor é legítima e necessária, mas a partidarização é nociva, tanto mais se atrelada a uma figura deletéria à pauta conservadora e liberal como o ex-presidente O Agrishow, a feira anual do agronegócio, é o principal fórum de discussão do setor no Brasil. É uma oportunidade valiosa para se debater questões transversais, como a conjuntura econômica internacional, políticas públicas de apoio, oportunidades de negócios, inovações tecnológicas e estratégias de sustentabilidade. E, no entanto, mais uma vez a feira esquenta as páginas do noticiário político. No ano passado, à custa de prestigiar o ex-presidente Jair Bolsonaro na solenidade de abertura, a direção do evento provocou tremendo embaraço ao desconvidar o ministro da Agricultura, Carlos Fávaro. O governo emendou mal o soneto, ameaçando retirar o patrocínio do Banco do Brasil, o que acabou não acontecendo. Mas a cerimônia de inauguração foi cancelada. Neste ano, a solenidade ofi

Editorial do Estadão, 28/04/2024

Está faltando pudor É louvável que ministros do STF discutam questões brasileiras. Bem menos evidente é a razão pela qual o fizeram em Londres, num hotel caríssimo e com tudo pago por uma empresa privada Junto com a balança e a venda, a toga preta simboliza a uniformidade, a isonomia, a sobriedade da Justiça. Todo servidor deve seguir os princípios da administração pública – impessoalidade, moralidade, publicidade, eficiência, legalidade –, mas, se aos juízes cabe um figurino, é porque devem não só segui-lo, mas representá-lo. Não basta ser íntegro, é preciso parecer. Mas as aparências às vezes enganam. É louvável que ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) se reúnam em fóruns para discutir questões jurídicas do País. É mais difícil entender, no entanto, os motivos pelos quais esses ministros precisaram sobrevoar o Atlântico para fazê-lo num caríssimo hotel de Londres, com tudo pago por um organizador privado. Entre os dias 24 e 26, celebrou-se no Hotel Peninsula, na capital britân

Editorial do Estadão, 27/04/2024

  Lei não se negocia; cumpre-se Em vez de simplesmente fazer o controle de constitucionalidade da lei do marco temporal, o STF prefere abrir um processo de ‘conciliação’, tarefa eminentemente política A propósito da demarcação de terras indígenas, em toda a existência da Nova República vigorou a tese do marco temporal, fixada pelo Supremo Tribunal Federal (STF) em 2009: os povos indígenas só poderiam reivindicar as terras que ocupavam (ou, no mínimo, disputavam) na data de promulgação da Constituição. Em setembro de 2023, o STF reverteu sua própria jurisprudência e derrubou a tese. Antes que a decisão fosse publicada, no entanto, o Congresso aprovou uma lei normatizando o marco temporal. Partidos e organizações civis entraram com processos questionando a sua constitucionalidade. Agora, o relator das ações, ministro Gilmar Mendes, suspendeu-as e abriu um processo de “conciliação”, convocando os autores das ações, os chefes do Executivo e do Legislativo, a Advocacia-Geral da União e a Pr